Entrevista- atletas paraolímpicos

Segundo a Wikipédia, esporte significa “atividade física ou mental sujeita a determinados regulamentos e que geralmente visa à competição entre praticantes.” Mas segundo Airton Fontinelle, David Brasiliano e muitos outros atletas, esporte é muito mais do que uma atividade física. Segundo eles o esporte é superação.
Passei na FCTM (Federação Cearense de Tênis de Mesa) para assistir o treino dos atletas paraolímpicos e também, claro, conversar com eles e conhecer um pouco de suas histórias.

Se liga aí na idéia que troquei com eles.

Airton Fontenele – 37 anos (Vice campeão cearense)

Raquel Amapos–  Conta um pouco da sua história pra gente. Você já nasceu com a paraplegia?

Airton. F – Não, no meu caso foi um acidente de carro aos 15 anos de idade.

R.A– E como que foi pra você, tão jovem, receber a notícia de que você não ia mais andar?

A.F- Foi muito difícil, porque eu era muito jovem e, para você ter uma noção, eu nunca tinha nem imaginado que  pessoas andavam de cadeira de roda porque haviam sofrido uma lesão na medula. Eu era completamente inocente a essa realidade.

R.A.- Como foi essa mudança, e qual foi a maior adaptação que teve quer ser feita??

A.F Não foi fácil não, a cabeça de um jovem que se depara com a possibilidade de não andar mais… Sei lá, não tem uma forma pra se definir.  E quanto à adaptação, eu fui obrigado a mudar logo tudo, sua vida vira de ponta cabeça, você não pode mais sair de casa, não pode mais passar por uma porta estreita. No início, você não entra em um carro sozinho, então é complicado. As adaptações são muitas.

R.A Há quanto tempo você joga e qual a importância do Tênis de Mesa para você?

A.F– Eu jogo há 1 ano e 3 meses. Ahh… O tênis de mesa hoje pra mim, depois da minha família, eu considero algo de maior importância. Porque hoje eu já sou um atleta profissional, a Coelce me patrocina. Ainda não tenho os títulos que pretendo, mas se Deus quiser vou chegar lá, eu to treinando bastante pra isso.

R.A E quanto ao apoio do governo aos atletas paraolímpicos é o mesmo?

A.F– Não, sinceramente, em mais de um ano que estou aqui eu não tive nenhum apoio. Tenho colegas que já tiveram, mas é muito difícil. Existe a Bolsa Atleta Estadual que está desativada desde o ano passado e  fica por isso, o mesa tenista não tem apoio.

R.A– Então é isso… Se quiser deixar algum apelo, algum recado. Fica a vontade.

A.F.- Pois é, a gente só quer que os governantes nos olhem com melhores olhos e percebam que a gente do paraolímpico tem muita força aqui no Ceará. Eu falo do paraolímpico, mas os convencionais também não recebem apoio. O tênis de mesa é um esporte meio que deixado no ca ntinho, ninguém ouve falar… Então é importante que a gente seja visto.

 

David Brasilino – 33 anos (medalhista de prata no parapan)

R.A No seu caso, foi um acidente também?

D.B– Não, no meu caso eu sou portador de paraparesia, que a perda temporária dos movimentos, vai completar 7 anos que quase não passo de uma cirurgia da retirada de um tumor da medula da regia torácica…. Desde 2004 eu me movo numa cadeira de rodas.

R.A– Foi difícil o processo de adaptação?

D.B– Então, quando eu fiquei sabendo, eu estava no auge como atleta, sempre gostei muito de esporte. E foi um impacto muito grande. Eu achei que não ia suportar, achava que minha vida tinha acabado naquele momento e que a partir dali não ia ter mais melhoras. Como em 2004 não estava tão evoluído como está hoje (tecnologicamente), não havia os recursos que tem hoje. Eu tive todo tipo de doença que você pode imaginar, tive ferimento, quase perdi minha perna esquerda. Quase tive que fazer hemodiálise por causa de um problema renal…

Eu passei um ano de cama depois da cirurgia, porque eu tinha poucos movimentos, tinha muita dor neuropática, que é a pior dor que qualquer lesado medular sente, então foi muito difícil, mas graças a Deus, a família e aos amigos que dividiram comigo cada dor, cada momento hoje eu to aqui firme e forte.

Minha tia, depois de me ver recuperado, me disse que tinha pedido a Deus para me levar na época porque eu passei de 74 para 49 kg, pois eu só me alimentava de complexo B (veia) e o meu primo, quase um irmão, me disse:  que nem acredita quando me vê viajando, superando meus próprios limites depois de tudo o que aconteceu.

R.A– E quais os esportes que você praticava antes?

D.B– Eu jogava vôlei, basquete e futsal. Por incrível que pareça no colégio, eu era da seleção das três modalidades. Eu gostava de farra, mas quando falava em esporte eu abdicava qualquer coisa para praticar, mesmo tendo alguns vícios, no caso eu bebia e fumava, eu sempre dei primeiro lugar ao esporte. O principal era o vôlei, e foi com ele que eu comecei a sentir dificuldade, sentir os sintomas como a dormência na perna que foi piorando e com três meses eu não conseguia   andar direito. Era como se eu tivesse tido uma AVC, paralisa metade do corpo e você começa a sentir dor. O médico descobriu que era um tumor e disse que era pra operar de emergência e eu relutei até o ultimo dia para ser operado, o mal do ser humano é esse: sempre deixa para depois.

O medico disse que eu podia ficar bom entre 2 e 8 anos podendo ser mais cedo ou mais tarde. Depende do tratamento, regeneração das células da medula. E se você me perguntar: David, qual foi o resultado do seu ultimo exame? – Com 7 anos, eu estou 80% recuperado. Antes eu sentia dormência do meu ombro pra baixo, não tinha força na mão esquerda, mas agora já melhorou. Não consigo andar, ainda, a perna é a que falta. Então é um processo lento, eu estou tranqüilo, se for pra esperar mais cem anos, eu espero na cadeira. Eu te digo que antes, eu era uma pessoa preguiçosa, já hoje não, quem corta a grama lá de casa sou eu, quem ajeita energia, viagem sou eu. Então, por incrível que pareça, a priori eu achava que tinha acabado minha vida, por causa da cadeira de rodas. Mas foi passando o tempo e eu vi que o importante é saber que tem um Deus por nós e que jamais ele da um fardo a mais do que a gente pode suportar. E a verdade é que sempre há uma superação. Eu venho conquistando coisas que até eu mesmo duvido.

R.A– Como você começou no tênis de mesa?

D.B: Eu me sentia o mal por ouvir “ô tão novo numa cadeira de rodas”. Relutei, até que recebi o convite nas quartas paraolimpíadas para participar do xadrez. Lá conheci o Eugênio, que me chamou para participar da competição de tênis de mesa e, por incrível que pareça, fui vice-campeão, aí me apaixonei, achei uma coisa fenomenal. Participei da quinta, sexta, sétima paraolimpíada e ganhei. Hoje graças a Deus eu sou um atleta da seleção brasileira, sou o único representante do norte-nordeste e já conheço 9 estados viajando com o tênis de mesa  além de conhecer a Venezuela.

R.A– E quanto ao apoio do governo aos atletas paraolímpicos?

D.B– Pra gente há uma precariedade muito grande. Ano passados nós fomos pedir ajuda pra a passagem para competir no campeonato brasileiro, aproveitando período eleitoral porque infelizmente a política é assim mesmo, e o estado se negou a dar a passagem pra gente.

Aqui, os paraolímpicos estão muito bem representados. Se a gente tivesse bolsa auxílio, estaríamos com resultados melhores ainda. O estado do Ceará possui quatro paratletas que poderiam muito bem estar nas paraolimpíadas, basta só a gente competir, viajar internacionalmente para ficar entre os 20 primeiros do mundo. Quanto mais a gente competir, mais pontuação a gente vai fazer e vai ranqueando melhor. E esse é o sonho de qualquer atleta

R.A, Então é isso, fica a vontade pra deixar um recado.

D.B– Só pedir pra que não só o estado do ceará, mas o Brasil venha  nos apoiar, porque antigamente quando uma pessoa via alguém com deficiência a chamava vulgarmente de “aleijado” e hoje nós estamos mostrando resultado, servindo de exemplo, trazendo resultados para o Brasil e mostrando para o mundo que o paraolímpico, independente de qual deficiência seja, está mostrando resultados expressivos.

Tem um trecho que eu sempre gosto de citar, de um livro que comecei a escrever, ”Uma vida apresentada de uma forma inovadora a partir de um relato de superação, tem sua narrativa dramatizada, mas sempre mostrando que não existe dificuldade maior que a capacidade de superação humana”

Pois é galera fica ai essa lição pra gente e o apelo pra população e pro governo quanto a valorização do atleta paraolímpico.

Espero que tenham gostado.

superação

BEIJOS =)

Sobre Raquel

Fotógrafa, ouvinte da boa música e apreciadora de idéias que fogem do padrão fútil aceito pela sociedade. http://www.raquelamaposfotografia.com/

4 Respostas para “Entrevista- atletas paraolímpicos

  1. Thalita ⋅

    Excelente entrevista. Vale ressaltar que os dois reclamaram da mesma coisa: falta de incentivos governamental. Uma pena,pois o esporte reabilita,da vida e animo pra quem quer que faça. (Y)
    Prometo não esquecer que comentei dessa vez :P

  2. Airton Fontenele (atleta) ⋅

    Gostei muito da sua iniciativa para com nosco mesatenistas, especialmente com o paraolimpico. Fiquei muito feliz em saber que tem pessoas que se importam, que querem saber, que vão atrás e colocam em discursão coisas que para muitos não tem a menor importância, por isso eu te agradeço por esta iniciativa louvável. Muito Obrigado.
    Airton Fontenele.

  3. Murillo

    Excelente entrevista. Tenho que fazer um trabalho sobre um atleta paraolímpico. Escolhi Airton Fontenele e estou pesquisando sobre ele. Esta pesquisa me ajudou bastante a fazer o trabalho. Obrigado, =)

  4. Airton Fontenele ⋅

    Olá, boa noite,
    Bem este não é bem um comentário é mais um recadinho. Ontem dia 15-06-2011 estava no meu treino como sempre faço 3 vezes por semana, quando me abordou um jovem rapaz no meio de uma partido pedido-me lilença, então me comunicou que a minha intrevista dada a Raquel e publicada em seu blog teria virado tema de trabalho de colégio, fiquei bastante feliz em receber esta noticia, pois é sempre bom divulgar essas coisas, colocar o máximo de pessoas a par da realidade, que para muitos ainda tão desconhecida. Por isso devo agradecer a Raquel por ter tido tão boa iniciativa, e ter feito tão legal, com tanto carinho. Obrigado Raquel. Estarei sempre a sua disposição.

    Airton Fontenele.

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